terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Sombras de ninguém


Neste período de férias tive a oportunidade de viajar de carro. Saindo de São Paulo, passei por Minas Gerais, Bahia até chegar em Sergipe.



O percurso de tão belas paisagens se misturam com a miséria encontrada à beira da estrada: homens e mulheres, jovens e idosos, crianças e bebês, todos famintos e desesperados por um ajuda que os faça esboçar algum sorriso.



Certa vez, em palestra do jornalista Cal Francisco, ouvi um radiodocumentário produzido por ele que denunciava a miséria das estradas da Bahia, em que pessoas de diferentes idades, inclusive crianças, imploravam por qualquer moeda ou pedaço de pão que fosse atirado de dentro de carros e caminhões na direção deles.



Foi isso que vi. Essas pessoas passavam a mão na barriga e estendiam a mão pedindo esmolas aos carros e caminhões que passavam a 120 km por hora nas estradas esquecidas. Eles se instalavam em "choupanas" feitas com palha e folhas largas de árvore, e lá, ao que tudo indica, passavam o dia todo, em família, esperando uma ajuda, ou, quem sabe, torcendo para que um carro ou caminhão tivesse algum problema no motor e, então, pudesse enxergá-los.



Pior do que presenciar é sentir-se impotente. Como ajudar pessoas que estão à beira de uma estrada que não se conhece as curvas, que a velocidade mínima é 80 km por hora e que não como deduzir em que locais eles estarão!



Isso passou pela minha mente enquanto observava essas famílias. Me senti como alguém que se compadece mas que nada faz. Me senti como sempre, pois, a ajuda e a real preocupação com o aflito não depende de uma imagem ou de uma realidade que choque meus princípios morais.



Considero que denunciar injustiças como essa que vi nas minhas férias em família, e tantas outras que esquecemos no dia-a-dia do próprio umbigo, é muito mais do que constranger-se ao ver a dor alheia. Ela deve nascer de uma consciência banhada de coração dedicado e desinteressado de troca e de recompensas.



Depois que passamos a parte da estrada em que vimos essas pessoas, a paisagem bela do percurso voltou a nos encantar, e logo esquecemos da dor que, embora seja um sentimento abstrado, foi possível ver caracturado.



Agora lembro-me com força de todos os que vi na estrada, mas assim como para tantos que nem sabem que eles existem, tenho a sensação de serem sombras, sombras de ninguém.